A maioria da população brasileira é negra. A informação é do Censo Demográfico (2010), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dos quase 191 milhões de brasileiros, a pesquisa mostrou que 97 milhões de pessoas se declararam pretas ou pardas, 91 milhões se consideram brancas, e o restante se enquadra em outros grupos.
Já as informações do estudo Dinâmica Demográfica da População Negra Brasileira, divulgado na última dia 12 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostrou que a população negra é mais jovem, tem mais filhos e é mais pobre. Esta mesma população também está mais exposta à mortalidade por causas externas – como homicídio – do que a população branca.
Em meio às pesquisas e declarações racistas das últimas semanas, dia 13 foi celebrado o Dia Nacional de Denúncia do Racismo. A data foi lembrada pelo movimento negro e por diversas organizações populares, sindicatos e partidos, através de atos culturais e políticos.
Para debater a questão racial e a luta do movimento negro no Brasil, a Radiogência NP entrevistou o integrante do Conselho Geral da Uneafro (União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora), Douglas Belchior.
Radioagência NP: Douglas, podemos afirmar que a questão racial se apresenta como algo estruturante da sociedade brasileira?
Douglas Belchior: O povo brasileiro, de maneira geral, quanto mais longe do estereótipo ideal eleito: branco, ariano, louro, de olhos claros; mais vai sofrer com a violência racial, com as desigualdades, com o preconceito, com a discriminação. Isso é estruturante das relações pessoais e é estruturante também das relações políticas e sociais. E aí que se geram as diferenças sociais que nós enxergamos.
RNP: Qual é a situação da população negra no Brasil atualmente?
DB: Quando olhamos para a pirâmide social, percebemos que não houve grandes mudanças nos últimos 123 anos – para considerar o fim da escravidão no Brasil. Hoje o povo negro continua ocupando os lugares precarizados na sociedade. Ocupa os piores empregos, têm os menores salários, são os mais agredidos pela ação policial. É esse público que é mais vitimado pelas mazelas sociais, entre os que não têm habitação, entre os que estão nas penitenciárias, entre aqueles que têm problema de atendimento na saúde pública, de acesso à escola de qualidade.
RNP: Os últimos acontecimentos envolvendo o deputado Jair Bolsonaro, por exemplo, explicitam a contradição entre o discurso de igualdade e os pensamentos e práticas racistas?
DB: O que nós percebemos é que nas últimas semanas, no último período, o debate sobre o racismo ocupou grande espaço nos meios de comunicação por conta das declarações, especialmente do [deputado] Jair Bolsonaro. Na verdade foi explicitado um pensamento politicamente tido como incorreto, mas que está no inconsciente da coletividade. Onde o racismo se reproduz de maneira mais radical é na ação policial, nos moradores de rua, quando a sociedade grita contra cotas em universidade pública. Não há muita contestação porque está naturalizado. Como diz o professor Kabengele [Munanga – Antropólogo e professor da Universidade de São Paulo]: todo racismo é um crime perfeito, porque ele se dá no cotidiano da vida social brasileira.
RNP: Como é feito o diálogo entre as pautas do movimento negro com as lutas de outros movimentos sociais?
DB: O diálogo tem sido cada vez maior. Os movimentos sociais e populares brasileiros têm percebido que é preciso construir unidade na ação. Agora, não tenha dúvida que existe ainda setores dos movimentos sociais que colocam a discussão racial como algo não emergencial ou não estruturante das relações sociais. E aí o movimento negro precisa fazer cada vez mais esforço pra fazer os companheiros e as companheiras perceberem que a questão racial é importante e prioritária para mobilização da classe trabalhadora. Porque, de maneira geral, a maioria da classe trabalhadora tem uma raiz e uma identidade racial.
RNP: Sobre a luta deste dia 13 de maio, quais serão as pautas prioritárias?
DB: Existem duas questões que caminham paralelamente, dentro da ideia que o Estado brasileiro implementa um projeto de genocídio da população negra. Existem essas duas ações paralelas: a negativa à cidadania, a negativa ao direito constitucional de acesso à educação, cultura, lazer, habitação, uma vida digna; e por outro, a ação armada do Estado, que vitimiza e que assassina o povo negro. Essas são as pautas principais que o nosso ato do 13 de maio deve levantar. Além do que, cobrar responsabilidade, botar freio na ação violenta do Estado e punir os responsáveis por tantos assassinatos que vêm ocorrendo no último período.
De São Paulo, da Radioagência NP, Vivian Fernandes.
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